"... Porque
não havia lugar para eles na estalagem."
PERSONAGENS
JULIANA, a mãe
AUGUSTO, o pai
JASMIM, filha
KAMAL, filho
José, Maria e 3
pastores, apenas comporão um quadro, e não terão diálogo.
CENÁRIO - Uma casa
pobre e rústica.
ACESSÓRIOS - Moedas
e um jarro rústico.
INDUMENTÁRIAS -
Túnicas compridas e mantos bem arranjados nos ombros dos homens e das mulheres. Variar
os tons das cores. Todos usarão sandálias rústicas ou estarão descalços.
ILUMINAÇÃO - Além
do sugerido, o grupo criará a seu modo, com bom gosto.
Cena
I
(ao
acender as luzes, aparece Augusto e Juliana em um lugar mais elevado. Pode ser
no púlpito)
Augusto,
mal humorado – Apressa-te, mulher!
Leva logo a bebida que os homens estão esperando.
Juliana,
amedrontada – Não me demoro. Estou
esperando que o carneiro esteja cozido.
Augusto,
autoritário – Nada de esperas! Vamos
de uma vez! Na adega está o vinho para levar-lhe. Você não passa de uma
preguiçosa.
Juliana
– Está bem, está bem... Mas sabes que não gosto de servir bebidas àqueles
homens. Parecem salteadores...
Augusto
– Mas precisamos de dinheiro e eles, mesmo que sejam salteadores, nos darão
dinheiro, e isso é o que importa. Além do mais, você mesma deve servi-los, pois
Kamal, nosso filho, está nos campos cuidando das ovelhas. (Juliana sai e Augusto fica contando suas moedas)
Augusto
– Mulher estúpida! Como pensa ela que poderemos viver se nos faltar o dinheiro?
(divaga) É mesmo preciso ter muitas
moedas, milhares de valiosas moedas! Ainda serei o homem mais rico das
redondezas. Em Belém hão de ouvir o meu nome! Ainda deixarei esta hospedaria,
que não passa de uma espelunca, por um negócio mais próspero e lucrativo.
(entra
Jasmim com um pote)
Jasmim
– Sua benção, meu pai.
Augusto,
aborrecido – Por onde andou, menina?
Jasmim
– Fui até o poço, buscar água.
Augusto
– Espero que seja mesmo verdade o que diz. Não gostaria de precisar espancá-la
novamente.
Jasmim,
amedrontada – Mas por quê?
Augusto,
ameaçador – Ainda perguntas por quê?
Pois bem, eu direi o motivo: um dos homens que traz a lenha para a estalagem
disse ter visto a ti e Kamal em companhia de parentes de Isabel, essa mulher
que alega ser temente a Deus. já disse muitas vezes para não se juntarem a
esses que esperam as coisas caírem do céu. Céu é ter dinheiro, e para isso é
que preciso trabalhar, ouviu bem?
Jasmim
– Não fale assim, meu pai. Devemos respeitar a Deus, que é o Senhor do
universo.
Augusto
– Cale a boca, pequena. Mulheres foram feitas para permanecerem caladas, bem
quietinhas, ouviu? (levanta a mão para
Jasmim, mas a entrada de Juliana o interrompe.)
Juliana
– O que é isso, Augusto? Por favor, não bata na menina outra vez! (muda
a conversa, para aliviar a tensão). Olha, está aí um
casal procurando hospedagem.
Augusto
– Quanto poderão pagar?
Juliana,
gaguejando – Na... na... não sei.
Penso que são muito pobres, e...
Augusto,
interrompendo – Pois que vão buscar
outro lugar. Não quero saber de pobres que não têm como pagar.
Juliana
– Mas meu marido, a mulher está quase a dar à luz um criança!
Augusto
– Pois que morram! Você ainda quer arranjar-me problemas, mulher? Onde já se
viu termos aqui uma criança a choramingar?
Jasmim, corajosa
– Mas temos uma vaga nos aposentos ao lado, pai.
Augusto
– Cala a boca! Vá, mulher, e diga que não temos lugar.
Juliana
– Mas para onde irão, se após o decreto de César Augusto para que venham os
alistar-se, a cidade está superlota?
Jasmim
– Não encontrariam hospedagem em nenhum outro lugar. Kamal, meu irmão, disse
que muitos dormem pelas estradas.
Augusto
– Sabem de uma coisa? Eu estou farto de vocês com suas constantes lamúrias. Não
quero que esses pobretões fiquem e é só! Vamos, Juliana diga-lhes que se
retirem imediatamente! (grita) – Vamos, eu já disse! (Juliana sai apressadamente e em seguida Jasmim, após o olhar de ódio
do pai.) Apagam-se as luzes.
Ao
aceder as luzes, entram José e Maria. Ele se dirige a uma hospedaria. Música
Cena
II
Kamal
entra pela porta da rua
Kamal,
gritando – Pai, Jasmim, minha mãe!
Onde estão todos?
(sob
luz fraca aparecem os familiares)
Augusto
– Mas que gritaria louca é esta, Kamal? Não pode falar mais baixo?
Kamal,
ofegante – Acendam as luzes! Tenho
uma notícia maravilhosa!
Juliana,
tocando o braço do filho – Kamal, meu
filho, não consegui dormir durante a noite preocupada com você. Por que demorou
tanto?
Kamal,
sacudindo energicamente, mas com carinho
a mãe, a abraça e, em seguida, aperta-a de encontro ao peito – Minha mãe,
oh! Minha querida mãe! Não imagina o que tenho a dizer-lhe!
Jasmim,
sorrindo – Pois fale logo meu irmão!
Não nos deixe tanto tempo na expectativa!
Augusto,
mal humorado – Imagino que se deve
tratar de mais uma de suas bobagens.
Kamal,
andando de um lado para o outro,
demonstrando grande euforia – Meu Deus, eu nem mesmo sei como começar! É
verdade: as palavras são tão pequenas para traduzir o fato inesperado e
esplêndido que se passou comigo! Que indizível felicidade! (olha para Jasmim) Sim, minha querida, vou narrar o que houve. (respira fundo) Durante a noite, eu
apascentava as ovelhas como de costume, com Zacarias e Elifaz, quando... (emudece de emoção)
Juliana,
tocando o roso do filho – Vamos,
filho, conte-nos!
Kamal
–
Apareceu-nos um anjo do Senhor!
Juliana
e Jasmim – Um anjo?
Kamal
– Sim! E a glória do Senhor cercou-nos de resplendor. De inicio ficamos
temerosos, mas ele nos disse que trazia novas de grande alegria para o povo.
Augusto,
irritado – Cale-se, Kamal! Você está
louco.
Kamal,
dirigindo-se com autoridade para o pai
– Não, meu pai, eu não estou louco e nem posso calar-me. (pausa) Pois bem, o
anjo contou-nos que na cidade de Davi acabara de nascer o Salvador, que é
Cristo, o Senhor.
Jasmim
–
Eu sabia! O Senhor havia colocado isto em meu coração.
(aparece
em outro plano a cena da manjedoura)
Kamal
– O anjo ainda nos disse que como sinal acharíamos o menino envolto em faixas e
deitado numa manjedoura. Depois, creiam, apareceu com o anjo uma multidão dos
exércitos celestiais louvando a Deus e dizendo:
Voz
dos anjos: “Glória a Deus nas alturas, paz na terra aos
homens, a quem Ele quer bem”.
Kamal
– Então fomos até Belém e tivemos a graça de ver o que o anjo nos anunciara.
Juliana
– Mas que grande benção, meu filho! Sabe, enquanto você fala tenho a impressão
de ver tudo o que aconteceu. E tenho em meu coração que o Messias é nascido
daquela mulher que esteve com o marido a procurar hospedagem em nossa porta.
Jasmim
– Também penso o mesmo, minha mãe. (abraça
o irmão) Oh! Kamal, como estou feliz! (olha
para o pai) Meu pai, o que se passa em seu coração?
Augusto
– Estou imensamente amargurado. Eu não sou digno de ter ouvido tudo isso.
Kamal
–
Como não é digno, meu pai? Todos temos o direito à salvação através da vinda do
Filho de Deus.
Augusto
– Todos não, eu nada mereço. Sempre fui um patife da pior espécie!
Juliana,
aproximando-se do marido – Pois é o
momento agora de arrepender-se, Augusto. Belém abriga hoje o Filho de Deus, que
veio salvar-nos de nossos pecados.
Augusto,
arrependido – Como pude ser tão
hipócrita, meu Deus! negando hospedagem a um pobre casal deixei de ter aqui
nesta casa o teu Filho, Jesus?... ajoelha-se,
chorando – Perdoa-me, Pai eterno, perdoa-me!
Kamal,
tomando as mãos do pai e ajudando-o a
levantar – Levante-se, meu pai. Tenho certeza de que as portas do céu foram
abertas agora para o senhor.
Augusto
–
A partir de hoje, a nossa hospedaria estará aberta a todos. O meu coração, como
a hospedaria, estará aberto para a humanidade. Os pobres, os angustiados, os
fracos, os filhos de Deus espalhados por toda a terra!
Apagam-se
as luzes.
Fonte: Jograis e Representações Evangélicas Vol. 1 (Maria José Resende), Editora CPAD