quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

O Dia Sexto


Personagens:
Rafael
Jonas
Sara
Jane
Maria
Poliana

Indumentárias: Roupas brancas e faixas coloridas que estarão no chão.

Ao inicio da peça todos os componentes estarão deitados em posição fetal.
Narrador, às escuras – “E disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança; e domine os peixes do mar e sobre todo o réptil que se move sobre a terra. E criou Deus o homem à sua imagem; macho e fêmea os criou. E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: ‘frutificai, multiplicai-vos e enchei a terra, sujeitai-a, dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu. E todo o animal da terra, toda árvore que dá semente e todo o fruto da árvore ser-vos-à para mantimento.’ E viu Deus tudo quanto tinha feito e eis que era muito bom. E foi a tarde e amanhã o dia sexto.”

Após a narração acende-se as luzes e os personagens vão levantando lentamente como se estivessem nascendo. Aos poucos vão descobrindo as suas mãos, pernas, rostos etc. descobrem também o lugar onde estão.

Rafael, tocando o braço de Jonas – Você! Quem é você? Por que estamos todos aqui?

Jonas – Não sei. Sei apenas que existo.

Sara, muito feliz, observa as mãos – Mãos... eu tenho mãos! Posso tocá-las, posso dar bom dia! (com a mão direita espalmada ao alto, cumprimenta os outros em cena.) Bom dia!

Jane, repetindo – Bom dia! É bom falar-lhes assim, agora que estamos todos aqui.

Maria, olhando à sua volta, e descobrindo – Este é o nosso primeiro dia – o dia primeiro da criação dos homens.

Poliana – Mas terá havido outros dias antes deste?

Rafael, rindo – Ora, mas certamente. Isto é o que se chama tempo. Algo dentro de mim fala da existência de outros dias antes de nós.

Sara, alegre – Vejam em que lugar maravilhoso nós estamos(olhando admirada à sua volta) montanhas imensas, vales verdejantes... flores belíssimas de todas as cores: rosas, margaridas, sempre vivas, jasmins, tantas!

Jonas – E o sol, lá em cima a todos iluminando. Imenso carro de Osíris em sua eterna caminhada...

Jane, para Rafael – Você falava da existência de outros dias antes de abrirmos os olhos para a vida. Acho que era os dias em que o Criador enfeitava a terra de árvores e flores, os dias em que cuidava do sol, da lua e das estrelas...

Poliana – Sim, e também criava os animais!
(Rafael sai para o meio do público como passeando).

Maria – Animais... Sim é verdade. Eu já vi alguns deles aqui na floresta. São tigres lindamente pintados, pássaros de mil cores, elefantes, búfalos! Hoje vi enormes búfalos e eles não fazem mal a ninguém.

Sara, rindo – É engraçado como já sabemos os nomes de todas as coisas como se, as palavras já existissem antes de nós, não é mesmo?

Rafael, voltando apressado para o meio de cena – Ei, vocês não imaginam o que descobri por detrás daquelas montanhas.

Jonas – O que foi homem? Que alegria é essa?

Rafael, quase atropelando as palavras – O mar... eu vi! Pude vê-lo com meus próprios olhos; o mar reinando em seu azul.

Poliana – Azul? Então quer dizer que o mar é azul? (encantada.)

Rafael – Sim! Quer dizer, embora também pareça verde, às vezes. Depende do modo em que o olhamos.

Sara – E o mar estava sozinho?

Rafael – Não; claro que não. O mar nunca está sozinho. Haviam as gaivotas muito brancas e barulhentas, que cantavam à sua volta. Mas não era só as gaivotas. Eu vi peixes aos milhares... e até as baleias, que são imensas! (eufórico) Vocês precisam ver as baleias! Elas são como donas dos mares e creio que morarão para sempre naquelas águas.

Maria, alegre – Então vamos todos ver o mar! O que estamos esperando?
(viram-se de costas, mãos dadas, e em seguida voltam-se de frente outra vez, rapidamente. Olham para a platéia que consideram o mar.)

Jane e Rafael – Vejam, chegamos! É o mar!
(soltam-se e começam a expressar gestos de enfiar os pés na água, lavar o rosto, jogar água uns nos outros, alegremente, como crianças.)

Sara – Silêncio! Vamos ouvir o que dizem as ondas, elas estão fazendo um barulho como se cantassem.

Todos, cantam alegremente o hino 124 da Harpa Cristã 1ª e 5ª estrofes:
“Adorai o Rei do Universo/ terra e céus, cantai o seu louvor!/ todo o ser no grande mar submerso,/Louve o Dominador!/
Todos juntos o louvemos!/Grande Salvador e Redentor!/ Todos o louvemos!/Régio Dominador!/
Altos cedros! grama verdejante!/ Esta sinfonia aumentai!/Aves, vermes, todo ser gigante,/Gratos a Deus Louvai!”

Rafael – As ondas falam do Criador, aquele que começou todas as coisas.

Jane – Eu gostaria... sim, gostaria de conhecê-lo.

Jonas – Eu também, e creio que todos nós gostaríamos de conhecê-lo, mas acontece que Ele está sempre entre nós. A paz e a união que temos é o que prova a sua presença. Apenas não podemos enxergá-lo porque a nossa visão é limitada.

Rafael – O amor entre nós é a presença do Criador. Não mais sentiríamos a sua presença se nós nos dividíssemos; se o nosso coração não fosse um só. E saibam: toda a natureza também nos fala de Deus.

Jane e Maria – “Os céus manifestam a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra de suas mão.”

Sara – “Um dia faz declaração a outro dia e uma noite mostra sabedoria a outra noite...”

Jonas – “Sem linguagem, sem fala, ouvem-se as suas vozes...”

Poliana – “A lei do Senhor é perfeita e refrigera a alma.”

Rafael e Poliana – “Quando vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste...”

Maria – “As aves do céus e os peixes do mar e tudo o que se passa pelas veredas dos mares...”

Todos, com as mãos elevadas para o alto:
- “O Senhor, senhor nosso, quão admirável é o teu nome sobre toda a terra!”
(cantam um corinho de mãos dadas e Jane sai, em seguida entra com um pão à guisa de bandeja.)  
Após o corinho, os personagens se assentam no chão em círculo. Entra Jane.

Jane, entra com um pão – Trouxe o pão, feito do fruto da terra.

Todos, em atitude de oração – Obrigado, Senhor, pelo pão.
(repartem o pão entre todos de modo alegre e sorridente.)

Sara e Rafael, chegando à frente – E eram assim (apontam para a reunião) felizes, antes do conhecimento do pecado.

Maria e Jonas, levantando-se com os demais – E então Deus passeava no Jardim do Éden...

Todos, tornando-se muito sérios, e ficando de frente para o público – Mas houve um dia, um dia diferente de todos os outros dias!

Poliana – O dia em que o mal penetrou no coração do homem. (viram de costas uns para os outros, dois a dois, ficando de lado para o público.)

Rafael, ainda na mesma expressão corporal – E, tendo pecado, afastou-se com isso o homem de Deus! (colocam em seguida as faixas que estavam no chão, para dar a idéia do símbolo do pecado que lhes manchou a roupa.)

Jane – Ao oriente do Éden, o homem levava o sinal de Caim e a marca do medo. (sentam-se no chão, cabisbaixos e tristes, ficando de pé apenas o que dirá o poema, e Jonas que sai de cena, cabisbaixo.)

Sara (ou outro componente) – Principalmente agora Senhor, é que sinto a tua falta;
Na hora de angustia e medo é que percebo, o quanto estou sozinha.
Só agora percebo, e me parece tarde, que estamos – Criador e criatura – separados!...
A tua ausência, Pai, é perder, estando vivo, a própria razão de viver!
Tudo perdi, perdendo eu a ti.
E agora, Senhor, ferida aberta na alma, sou apenas uma enorme sede do teu imenso amor.

Poliana, levantando-se alegremente – Mas, não! Deus não abandonou o homem ao seu próprio destino... Cristo veio habitar entre nós! (levantam todos as mãos para o alto em atitude de louvor e alegria, e permanecem em estático por alguns segundos e, em seguida, começam a representar “O Cego de Jericó”.)

Maria, animada – Dizem que Ele, o Cristo, passará hoje por aqui, de caminho para Jericó!

Rafael – É mesmo verdade? O Mestre pisará por estes caminhos? Onde ouviu a noticia?

Sara, interrompendo alegremente – Ora, não se fala em outra coisa na cidade. Também ouvi hoje cedo, no mercado.

Poliana – Dizem que Ele virá com uma grande multidão, que o acompanha sempre, por onde quer que vá!

Jane – Então poderemos vê-lo? Mas isto é magnífico!

Rafael, muito emocionado – Lá está! (aponta para a porta da rua) É o Mestre! O Messias, que caminha entre o povo.

Jonas, um cego, entra pela porta dos fundos, tropeçando e caindo – Onde? Onde está Ele? (grita) Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim! Senhor, pois quero ver a luz do sol; toca os meus olhos, filho de Davi!

Todos, estendendo as mãos para Jonas – Vê, a tua fé te salvou!

Jonas, pulando de alegria – Eu vejo! Eu vejo!!! Estou curado. Eu vi o rosto do Mestre Jesus e agora verei o sol. (ajoelha-se.) “Louvado sejas, Deus! Oh! Senhor, obrigado. Louvado sejas!”

Todos, cantam um corinho bem alegre, depois espalham-se pelo público, com o semblante sério.

Rafael – O Cristo esteve entre os homens curando enfermos e ressuscitando mortos.

Poliana – Mas veio principalmente para conduzir os homens ao Céu.

Jane – Veio para o que era seu e os seus não o receberam.

Sara – E retribuíram o seu imenso amor com uma pesada cruz!

Todos – A cruz que o conduziu ao Calvário. (retornam ao centro de cena curvados, cabisbaixos e tristes.)

Rafael, com as mãos para trás – “Senhores, o que é necessário que eu faça para me salvar?”

Todos, muito alegres – “Crê no Senhor Jesus e serás salvo, tu e a tua casa.”

Sara, indecisa – Mas ainda hoje, nos dias dos foguetes interplanetários?

Rafael – Sim, hoje nos dias das grandes conquistas espaciais.

Jonas – Agora mesmo estão acontecendo maravilhas nos laboratórios científicos...

Jane, sem esperança – Não, eu não creio que a mensagem de Cristo seja a mesma hoje em dia. As nações disputam o domínio da terra e prevalece o mal contra o bem.

Todos, animados – Ainda hoje sim! – Cristo é o mesmo eternamente!

Maria – Desde a criação, desde o momento primeiro Ele é o mesmo!
Poliana – Mesmo antes que existissem as estrelas no firmamento e antes que a relva crescesse no chão.

Sara – Ele reina sobre os mares, os céus e a natureza inteirinha.

Rafael – E voltará um dia! E todo joelho há de dobrar-se diante dele.

Jonas – Sim, há de voltar! E o povo que é seu o aguarda ansiosamente. (tiram as faixas e jogam pelo chão.)

Poliana – Quem é esse povo de que falas? Estes que estão vestidos de branco, quem são e de onde vieram?

Maria – Os vencedores! Eles serão vestidos de vestiduras brancas e seus nomes não serão riscados, nunca, do Livro da Vida!

Todos, apontando para o público – Vistam depressa de branco os seus corações! De branco como a neve. Aceitem Cristo, que não tarda a voltar!

Fonte: RESENDE, Maria José. Jograis e representações evangélicas. CPAD. Vol. I.
Foto: Arquivo pessoal - GPCD